Um funcionário da Microsoft foi detido nas instalações da empresa em Redmond, Washington, em meio a uma série de protestos direcionados aos contratos da gigante da tecnologia com o governo de Israel. O incidente ocorreu durante o segundo dia de manifestações organizadas por um grupo de ativistas, que resultaram em múltiplas prisões e na intensificação da pressão sobre a corporação.
As ações de protesto, lideradas pelo grupo “No Azure for Apartheid”, visam especificamente os contratos de serviços de nuvem que a Microsoft mantém com o estado israelense. Os manifestantes argumentam que a tecnologia fornecida pela empresa pode ser utilizada em operações que consideram violadoras dos direitos humanos.
Início dos Protestos e Ações no Campus
Os protestos tiveram início na terça-feira, quando um grupo composto por funcionários atuais e antigos da Microsoft, juntamente com membros da comunidade local, ocupou uma praça central na sede da empresa em Redmond. O objetivo inicial era chamar a atenção para a questão dos contratos e expressar o descontentamento com o envolvimento da Microsoft.
No primeiro dia, as manifestações transcorreram de forma relativamente pacífica, com os participantes se reunindo e expressando suas reivindicações. As autoridades locais monitoraram a situação, e o grupo foi disperso sem maiores incidentes ou prisões, conforme relatos iniciais.
A situação, no entanto, escalou no segundo dia de protestos, na quarta-feira. Os manifestantes retornaram ao campus da Microsoft e estabeleceram o que denominaram um “Acampamento de Zona Libertada”. Esta ação visava criar uma presença mais permanente e visível no local, reforçando a mensagem do grupo contra os contratos da empresa.
Durante as atividades de quarta-feira, um ato simbólico marcou a manifestação: tinta vermelha foi derramada sobre um dos sinais da Microsoft no campus. Segundo os organizadores do protesto, este gesto representava o “sangue” associado aos contratos da empresa com Israel, buscando dramatizar a percepção de cumplicidade da Microsoft em conflitos.
A polícia de Redmond, responsável pela segurança na área, interveio na quarta-feira. As autoridades alegaram que alguns manifestantes bloquearam uma ponte pedonal e tentaram criar uma barreira utilizando mesas e cadeiras que, segundo a polícia, foram subtraídas das instalações. A polícia também afirmou que, em determinado momento, alguns manifestantes “se tornaram agressivos”, o que levou à decisão de realizar prisões.
Prisões e Identificação dos Detidos
O segundo dia de protestos resultou na detenção de 18 indivíduos. Entre os presos, foi confirmada a prisão de Anna Hattle, uma engenheira de software que atualmente trabalha na equipe de nuvem e inteligência artificial da Microsoft. A detenção de um funcionário ativo da empresa adicionou uma nova dimensão ao movimento, destacando o envolvimento interno nas reivindicações.
Abdo Mohamed, um dos organizadores do grupo “No Azure for Apartheid” e ele próprio um ex-funcionário da Microsoft que foi demitido, confirmou à imprensa as prisões de Hattle, bem como de outros dois ex-funcionários da Microsoft: Hossam Nasr e Vaniya Agrawal. A presença de ex-funcionários entre os detidos sublinha a continuidade e a profundidade do ativismo contra as políticas da empresa.
Em um comunicado à imprensa, o grupo “No Azure for Apartheid” informou que os indivíduos detidos incluíam tanto trabalhadores atuais e antigos da Microsoft quanto membros da comunidade de Seattle. Esta composição demonstra o apoio mais amplo que o movimento busca angariar, transcendendo as fronteiras da empresa para incluir ativistas e cidadãos preocupados com as questões levantadas.
Histórico de Protestos e Interrupções
As recentes manifestações em Redmond não são um evento isolado, mas sim a continuação de uma série de ações organizadas pelo grupo “No Azure for Apartheid” e ativistas relacionados nos últimos meses. O movimento tem se dedicado a chamar a atenção para os contratos da Microsoft com o governo israelense, utilizando diversas táticas de protesto em diferentes plataformas.
Em um incidente notável, um ex-funcionário da Microsoft interrompeu o evento de 50º aniversário da empresa. Durante a interrupção, o ativista dirigiu-se ao CEO de IA da Microsoft, Mustafa Suleyman, classificando-o publicamente como um “aproveitador de guerra”. Este ato visava expor a percepção de que a empresa estaria lucrando com conflitos e violações de direitos.
No mesmo evento de aniversário, os três CEOs da Microsoft – Bill Gates, Steve Ballmer e Satya Nadella – foram igualmente interrompidos por outro ex-funcionário. Essas interrupções em eventos de alto perfil demonstram a estratégia dos ativistas de utilizar plataformas públicas para amplificar suas mensagens e pressionar a liderança da empresa a reconsiderar suas parcerias.
A conferência Build da Microsoft, um dos principais eventos anuais da empresa para desenvolvedores e parceiros, também foi palco de múltiplas interrupções por parte do grupo no início deste ano. A recorrência dessas ações em eventos corporativos importantes indica a persistência e a determinação dos manifestantes em manter a questão em pauta e visível para um público amplo.
A intensidade e a frequência desses protestos levaram a Microsoft a implementar medidas internas. Em um caso específico, a empresa chegou a bloquear e-mails que continham a palavra “Palestina”, uma ação que gerou controvérsia e destacou a tensão crescente entre a corporação e alguns de seus funcionários e ex-funcionários que apoiam a causa palestina.
O Contexto dos Contratos e as Alegações Recentes
A base para as atuais manifestações reside em revelações recentes sobre o uso dos serviços da Microsoft por parte do governo israelense. Poucos dias antes dos protestos mais recentes, uma investigação conjunta de grande repercussão foi publicada pelo The Guardian, em parceria com a +972 Magazine e a Local Call, veículos de imprensa com foco na região.
A reportagem investigativa indicou que o governo israelense estaria utilizando os serviços de nuvem da Microsoft para armazenar um vasto volume de dados e gravações de chamadas telefônicas de palestinos. A investigação apontou que a plataforma Azure da Microsoft estaria sendo empregada para gerenciar até um milhão de chamadas por hora, levantando sérias preocupações sobre privacidade, vigilância em massa e o papel da tecnologia em contextos de conflito e ocupação.
Os manifestantes do “No Azure for Apartheid” argumentam que, ao fornecer infraestrutura tecnológica para tais operações, a Microsoft se torna cúmplice de ações que eles consideram violadoras dos direitos humanos e que contribuem para a opressão de populações. A demanda central do grupo é que a Microsoft encerre todos os seus contratos com o governo israelense, especialmente aqueles que podem ser utilizados para fins militares, de vigilância ou que contribuam para a manutenção de um sistema que os ativistas classificam como apartheid.
A pressão sobre empresas de tecnologia para que reavaliem suas parcerias governamentais tem crescido globalmente, especialmente em relação a contratos que podem ter implicações éticas ou de direitos humanos. O caso da Microsoft e seus contratos com Israel se insere nesse contexto mais amplo de escrutínio público e ativismo corporativo, onde a responsabilidade social das empresas é cada vez mais questionada.
Resposta da Microsoft
Em resposta às alegações e aos protestos, um porta-voz da Microsoft, que não teve seu nome divulgado, emitiu um comunicado à Komo News. A empresa afirmou que está “buscando uma revisão completa e independente das novas alegações” que foram inicialmente reportadas no início do mês sobre o suposto uso de sua plataforma Azure em Israel.
Esta declaração sugere que a Microsoft está ciente das preocupações levantadas e está disposta a investigar a fundo as implicações de seus contratos. A busca por uma “revisão independente” pode ser interpretada como uma tentativa de garantir transparência e imparcialidade na avaliação das alegações, buscando uma análise objetiva da situação.
O comunicado da Microsoft também reiterou o compromisso da empresa em “continuar o trabalho árduo necessário para manter seus padrões de direitos humanos no Oriente Médio”. Esta parte da declaração visa assegurar ao público e aos stakeholders que a empresa leva a sério suas responsabilidades éticas e sociais na região, apesar das controvérsias.
Adicionalmente, a empresa declarou que está “apoiando e tomando medidas claras para lidar com ações ilegais que danificam propriedades, perturbam negócios ou que ameaçam e prejudicam outros”. Esta parte da declaração aborda diretamente os incidentes de vandalismo e interrupção ocorridos durante os protestos, indicando que a Microsoft defenderá seus ativos e operações contra atos considerados ilegais, enquanto busca resolver as preocupações subjacentes.
A posição da Microsoft reflete a complexidade de operar em um cenário geopolítico sensível, onde a empresa precisa equilibrar seus interesses comerciais com as crescentes demandas por responsabilidade social e ética. A situação em Redmond continua a ser um ponto de atenção para a interseção entre tecnologia, ativismo e direitos humanos, e o desdobramento das investigações e protestos será acompanhado de perto.
Fonte: https://www.theverge.com/news/763261/microsoft-employee-arrested-headquarters-protest-redmond-police
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